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domingo, 12 de fevereiro de 2017

Reflexões acerca da Ação Civil Pública N. 5044874-22.2013.4.04.71/RS

A presente Nota é um convite para a reflexão no que tange à Ação Civil Pública No 5044874-22.2013.4.04.7100/RS e seus procedimentos. Reflete as discussões, ainda em curso, de diferentes profissionais de Serviço Social, e de diversos lugares do país. Traz à tona as medidas anunciadas em videoconferência pela Divisão do Serviço Social – DSS; no Clipping do Serviço Social enviado no dia 13 de julho de 2016; e nos Memorandos-Circulares Conjuntos no58 e no62 DIRBEN/DIRAT/DIRSAT/INSS de 16 e 30 de novembro de 2016, respectivamente,no que diz respeito a aplicação dos efeitos da decisão relativa à Ação Civil Pública - ACP.



A ACP, deu:

(...) parcial provimento ao recurso do Ministério Público Federal, julgando
parcialmente procedente o pedido para condenar o INSS a deduzir do cálculo da renda familiar, para fins de verificação do preenchimento do requisito econômico ao benefício de prestação continuada do art. 20 da Lei no 8.742/93, apenas as despesas que decorram diretamente da deficiência, incapacidade ou idade avançada, com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis e consultas na área da saúde, requeridos e negados pelo Estado, estendendo os efeitos deste julgado a todo o território nacional, nos termos do  relatório, votos e notas taquigráficas que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. (grifo nosso)

Na apelação apresentada pelo Ministério Público Federal sustenta que:

(...) a existência de políticas públicas não pode servir de óbice ao pedido posto
na causa, uma vez que tais políticas nem sempre cumprem o seu papel, notadamente quando se trata de assegurar toda uma gama de produtos e serviços que possam virtualmente necessitar pessoas com deficiência ou idosos. Asseverou que a dedução de despesas relacionadas com a deficiência, com a idade avançada ou com a incapacidade é obrigação que se extrai da Constituição e da Lei, devendo preceder ao cálculo da renda familiar de benefício assistencial. Sustentou que, até que sobrevenha lei que  estabeleça critério mais detalhado para a aferição da vulnerabilidade econômica da família do idoso ou pessoa com deficiência incapaz de prover o próprio sustento, haverá de se suprir a omissão constitucional do Estado pela adoção de interpretações que estejam de acordo com a Lei Fundamental, sendo a exclusão das despesas inerentes à condição do beneficiário do cálculo da renda familiar a única interpretação aceitável. (grifo nosso)

Assim, a ACP prevê a dedução do cálculo das despesas do requerente idoso ou pessoa com deficiência com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis e consultas na área da saúde, requeridos e negados pelo Estado, quando a renda do grupo familiar for igual ou superior a 1⁄4 do salario mínimo vigente. No entanto, os efeitos da ACP são limitados. Corre-se o risco dos efeitos de tal ação não atingirem nem os requerentes que têm condições de
pagar pelos serviços/medicamentos, obtendo os comprovantes das despesas e que ao mesmo tempo não conseguem a denegatória do Estado; e principalmente a parcela dos requerentes que não tem condições materiais de adquirir os serviços/medicamentos, não obtendo, portanto, os comprovantes de despesas e igualmente terão dificuldade de obter a denegatória do Estado. Ademais, não considera outros elementos inerentes à sobrevivência dos indivíduos como habitação, educação, alimentação, etc.

Chama a atenção e também preocupação que a comprovação documental das despesas bem como a denegação de atendimento de serviços públicos de saúde seja analisada pelo setor administrativo, visto que as normativas exaladas não detalham a forma, o conteúdo e a descrição, deixando assim alta margem de discricionariedade para uma questão tão séria. Não obstante gera ainda obrigações aos trabalhadores (as) desse setor que já se encontram sobrecarregados, em especial com as alterações dos procedimentos administrativos em decorrência das alterações do BPC – Benefício de Prestação Continuada pela Portaria Conjunta MDSA/INSS no 1 de 03/01/2017.

A presente nota aponta para reflexão o do desenho do fluxo (até então esboçado nos memorandos acima citados) que inclui o Parecer Social emitido pelos profissionais de Serviço Social do INSS, divulgação em âmbito institucional em caráter restrito do Memorando-Circular Conjunto no62 DIRBEN/DIRAT/DIRSAT/INSS de 30 de novembro de 2016 que no Item 2
estabelece:

Se o requerente apresentar os documentos comprobatórios das despesas que decorram diretamente da deficiência, incapacidade ou idade avançada com medicamentos, alimentação especial, fraldas descartáveis e consultas na área de saúde e da negatória dos órgãos responsáveis pela prestação, estes devem ser juntados ao processo administrativo do benefício e o expediente deve ser encaminhado, fisicamente, ao profissional assistente social, para avaliação quanto ao comprometimento da renda familiar.

No item 4, alínea "b" do mesmo memorando, diz ainda que para o cumprimento da exigência aberta pelo servidor administrativo, caso a pessoa tenha entregue a documentação necessária, e o processo analisado pelo Serviço Social, o Parecer Social deverá concluir pelo "Não comprometimento da renda" ou pelo “Comprometimento da renda".

Valendo-se do que dispõe o Manual Técnico do Serviço Social (DIRSAT/Março de 2012) a respeito do Parecer Social, conforme transcrição abaixo, entende-se se tratar de instrumento técnico que tem como função fornecer subsídios ao reconhecimento do direito, cabível quando agrega elemento de convicção para elucidar dada situação social, conforme segue abaixo.

O parecer social consiste no pronunciamento técnico do assistente social, com base no estudo de determinada situação, e tem como objetivo fornecer elementos para reconhecimento de direitos, manutenção e recurso de
benefícios e decisão médico-pericial. O parecer social será conclusivo, em matéria de Serviço Social. (Manual Técnico do Serviço Social, 2012, p. 26). É importante resgatar também, de acordo com o Manual Técnico do Serviço Social (2016, p.26):

O referido instrumento [Parecer Social] não se constitui em mecanismo de fiscalização, constatação, averiguação de veracidade de fatos, provas ou informações prestadas pelo usuário, consistindo em recurso viabilizador de direitos, na perspectiva da cidadania, equidade e justiça social. (...) O parecer social expressa a opinião do assistente social com base na observação e estudo social da realidade. De acordo com Fávero (2004, p. 42), o estudo social “tem
por finalidade conhecer com profundidade, e de forma crítica uma determinada situação ou expressão da questão social, objeto da intervenção profissional, especialmente nos seus aspectos sócio-econômicos e culturais”. (grifo nosso)

Ademais o referido instrumento é atividade privativa do(a) Assistente Social conforme a lei 8.662/1993 que regulamenta a profissão, art. 5o inciso IV.

Considerando que o teor e alcance da ACP é o de aplicar desconto ao cálculo da renda per capita, o comprometimento do orçamento familiar será demonstrado por comprovante de despesas especificadas na ACP. Isso significa dizer que não se cogita inobservância do critério objetivo da renda de 1/4 per capita familiar, bem como também não admite considerar elementos outros que tornem elegível quem apresenta renda per capita familiar a partir de ¼ do salário mínimo como alimentação, moradia, educação, etc., que também são direitos sociais constitucionalmente garantidos, sendo estes um dos óbices da questão, pois esta limitação da ACP poderá ressoar na elaboração do Parecer Social.

Nos termos em que estão detalhados os procedimentos da ACP, bem como os quesitos formulados, produz dúvidas quanto ao papel do Parecer Social e a decisão final do processo, visto que o Parecer Social é instrumento técnico privativo do(a) Assistente Social amparado na lei 8.662/1993 e consequentemente pautado no código de ética profissional, e nesse sentido
sua elaboração, conteúdo e conclusão refere-se a autonomia profissional sobre o parecer de dada realidade social.

E nesse sentido assevera Fávero (2009, p. 22):

É esse profissional que, por uma ação refletida e planejada, define quais conhecimentos deve acessar e em que nível vai aprofundá-los; se necessita realizar entrevistas, com quem e quantas pessoas (por exemplo, com a criança,
o adolescente, o pai, a mãe, outro adulto, responsáveis por escola ou outro equipamento social que frequentam etc.), se deve realizar visitas domiciliares e/ou institucionais, se precisa estabelecer contatos variados com a rede familiar e a rede social, se deve consultar material documental e bibliográfico e quais; etc. (grifo nosso).

Ao que tange a formulação de quesitos Fávero (2009, p. 22) esclarece:

Em muitos casos, o assistente social poderá ser solicitado a responder quesitos, que são questões relativas a esclarecimentos que as partes envolvidas na ação, representadas por seus defensores, formulam, para as quais avaliam que o profissional deveria trazer respostas. Nesse caso, o assistente social responde àquelas que dizem respeito a prerrogativas, princípios e especificidades da profissão – em itens específicos ou no corpo do registro –, seja relatório ou laudo, apontando também, se for o caso, que não é de sua competência oferecer respostas a eventuais quesitos que fogem à sua área de formação. (grifo nosso).

Daí apontamos questões que nos parece urgentes e fundamentais:

· Temos nitidez dos objetivos do Parecer Social como instrumento técnico do Serviço Social proposto na Matriz teórico-metodológica do Serviço Social na Previdência (1994) e resguardado pelo Manual Técnico do Serviço Social, pela lei que regulamenta a profissão e o código de ética profissional?

· Partindo das nossas atribuições profissionais e tendo como prerrogativa normativas institucionais e profissionais que definem o Parecer Social como atribuição privativa do Serviço Social, como poderíamos criar estratégias de emitir nossa opinião técnica, a fim do reconhecimento do direito e sem cair no estratagema de realizarmos cálculo pecuniário entre despesas pré-definidas/receitas dos requerentes, visto que, realizar prioritariamente cálculos é pertinente a outras áreas de saberes como matemática, contabilidade, etc?

· Como materializar a ACP na perspectiva de ampliação do acesso ao direito ao Benefício de Prestação Continuada - BPC, valorando o Parecer Social como instrumento desse processo?

Vislumbra-se assim, claramente a necessidade do envolvimento dos profissionais do Serviço Social do INSS na socialização de informações aos requerentes a fim de melhor instruir para o acesso ao direito conforme dispõe a lei n. 8.213/1991, art. 88 e na articulação com setores da comunidade e poder público local, uma vez que, para os requerentes não se trata de providência simples o cumprimento das condições exigidas para se beneficiarem da ACP, e para a profissão será um desafio criar estratégias para a exequibilidade dessa atividade.

Verificasse, ainda, que esta discussão não deve se limitar ao Serviço Social previdenciário, mas deve abarcar o Ministério Público que promoveu a ACP, a Procuradoria Federal Especializada do INSS, setor de benefícios, o Juizado Especial Federal – JEF, o Conselho Federal de Serviço Social – CFESS, sendo o diálogo entre as diversas instâncias fundamentais para a compreEnssão da temática, a valorização do Parecer Social e a materialização da ACP como medida garantidora da justiça social.

Por fim, acredita-se que as questões apresentadas só poderão ser mitigadas a partir da ampliação da discussão e esclarecimento sobre essa temática. Urge, portanto, um posicionamento da Divisão do Serviço Social - DSS sobre o direcionamento técnico, operativo, teórico e ético do Serviço Social previdenciário, definindo não apenas os fluxos operacionais, mas dando subsídios para a capacitação/orientação da categoria sobre a emissão do Parecer Social de modo que este não perca a dimensão de garantir direito e não adquira um caráter fiscalizatório no sentido da comprovação dos documentos apresentados pelos requerentes Pois caso o Parecer Social seja transformando em apenas uma relação aritmética, expressa violenta agressão à lei que regulamenta a profissão e poderá não agregar valor ao processo de reconhecimento de direito, sendo, portanto, inócua e residual sua ação, restando somete assim aos profissionais recusarem-se a esse fim.

POR NENHUM DIREITO A MENOS! SÓ A LUTA MUDA A VIDA!

Comissão de Assistentes Sociais da FENASPS

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